Para a conclusão da disciplina Fundamentos Arquivísticos, foi
proposto aos alunos do 5º semestre desenvolverem um texto tratando da
importância dos arquivos como função social.
Os textos foram elaborados com base em dois capítulos do livro
“Arquivo: estudos e reflexões” de Heloisa Liberalli Belloto, publicado em 2014.
"ARQUIVOS - FUNÇÃO SOCIAL
Nos textos de Heloísa Bellotto, em que relaciona o
arquivo à sociedade, destaca-se a sua constatação sobre a identidade cultural
estar ligada à memória e história, salientando as ações educativas e a difusão
cultural, sobretudo dos arquivos públicos. Ampliar as funções básicas dos
arquivos, não só reunindo, organizando, conservando e dando acesso às
informações neles contidas, mas acrescentando a isso as políticas e ações
voltadas a educação e cultura, é um debate que a autora defende.
Entender o arquivo como parte do
patrimônio cultural de uma sociedade requer, no entanto, uma relação do público
com este instrumento de memória social e, para isso, as ações culturais e
educacionais são fundamentais, pois o arquivo ainda se encontra distante da
percepção do homem comum. Essa percepção, que a autora qualifica como
“sensível”, do homem comum com o arquivo, também deve ser levada em conta
quando se pensa na relação da sociedade com o arquivo, ou seja, quando se
debate a função social deste.
Todos que já tiveram em algum
departamento público ou privado, solicitando, por exemplo, algum papel para
aposentadoria, já sentiu o que é depender de um arquivo para a resolução de um
problema prático. Nas sociedades menos democráticas e mais burocráticas, a
visão do arquivo para o usuário é semelhante à postura do personagem de Franz
Kafka diante do Castelo, um lugar no qual ele não tem entrada. O personagem de
Kafka passa todo o romance tentando adentrar no castelo, sem conseguir.
Seguindo essa metáfora do castelo inacessível por burocratas, o acesso aos documentos dos arquivos muitas
vezes é entendido com este grau de
distanciamento e alienação por parte de quem os buscam, custodiados por alguém,
um funcionário, que tem o poder de cercear o acesso à informação neles contida.
Sendo assim, passam a ideia de que os documentos contêm informações das quais somos
alijados por um capricho do Estado ou da instituição custodiadora.
Esta visão burocrática da
administração pública ainda se encontra muito associada à visão que se tem dos
arquivos. Mesmo uma pessoa que precisa consultar um CEDOC, até para uma pesquisa
acadêmica, em geral precisa dar justificativas (e preencher muitos formulários)
para poder ter acesso aos documentos que precisa consultar. A relação é sempre
de subordinação e de subserviência, como se estivéssemos submetidos à boa
vontade de um arquivista para poder ter acesso a algo que pode parecer mais
dele do que nosso, no sentido de bem social de todos.
Contrapondo-se a essa visão do homem
comum aos arquivos é que as ações educacionais e de difusão cultural devem se
estabelecer, no sentido de quebrar um estereótipo tanto do arquivista como do
aspecto inacessível dos arquivos. As ações educativas são eficazes nesse
sentido, pois estar em um arquivo e poder pesquisar documentos, desde quando
somos estudantes, minimiza esta percepção de bem comum lacrado a poucos e de
uma administração que guarda informações “secretas” sobre os cidadãos. O estudo
da história, mesmo entre estudantes do ensino fundamental, hoje está pautado
por uma metodologia de ensino que aborda os documentos como base para o entendimento
do tempo histórico. Um estudante ter a possibilidade de estudar história pelo
contato direto dos documentos, tal como proposto pelas ações educativas do
Arquivo Público do Estado de São Paulo, por exemplo, é fundamental para que a
noção de algo público (e não particular e inacessível) tenha lugar na percepção
do homem comum em relação aos arquivos.
É importante ainda ressaltar que a
memória social, da qual os arquivos permanentes são a salvaguarda, devem ser
mobilizadas e analisadas por quem as procura, não sendo algo dado e de fácil
apreensão. Para fazer uso da memória, é necessário senso crítico. A memória
estabelecida dentro dos arquivos deve servir inclusive para que uma sociedade
não igualitária seja questionada por quem tem acesso às informações neles
contidas, pois o uso é sempre crítico, do contrário é apenas um patrimônio
cultural sem uso efetivo, o que não tem de fato uma função social para quem o
consulta. Fazer um uso crítico, porém, demanda educação e contato com essas
possibilidades de análise que o arquivo proporciona. Sendo assim, é de
importância fundamental um arquivista interessado em que isso ocorra – e
consciente de seu papel social –, atuando para apresentar todas as
potencialidades de pesquisa de um arquivo.
Ao permitir ao público visualizar e
adentrar nos arquivos, essas ações culturais devem mobilizar os estudantes a
entender que a história, escrita, sobretudo, pelos vencedores, também pode ser
reescrita quando a memória de uma sociedade é preservada."
Referências
BELLOTTO, Heloísa Liberalli.
Arquivo e sociedade: políticas e ações voltadas para a cultura e para educação.
In: BELLOTTO, Heloísa Liberalli. Arquivo: estudos e
reflexões. Belo Horizonte: UFMG, 2014. p. 132-143.
BELLOTTO, Heloísa Liberalli.
Documento de arquivo e sociedade. In: BELLOTTO, Heloísa Liberalli. Arquivo: estudos
e reflexões. Belo Horizonte: UFMG, 2014. p. 306-317.
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