Bruno
Carvalho, ex-aluno de Biblioteconomia da FESPSP, começa hoje com uma coluna que
fala a respeito de bandas e o que elas leem, mostrando que musica e livros
podem ter tudo a ver!
━ A Finis Africae surgiu em
uma época que Legião Urbana, Plebe Rude
e Capital
Inicial dominavam o espaço na cena do rock brasileiro. Após o sucesso de
"Armadilha" nas rádios, no ano de 1986, a banda continuou o caminho e
conseguiu colocar no mercado um LP homônimo. O Finis Africae
encerrou as suas atividades em 2002.
Eduardo de Moraes – Vocalista da banda Finis
Africae.
1)
Eduardo
quando você decidiu ser músico? Tocou em outras bandas antes do Finis
Africae? Porque foi morar em Brasília?
Minha
ida para Brasília se deve ao fato de meu pai ter sido funcionário público e foi
transferido do Rio de Janeiro para lá. Nos dois primeiros anos que morei lá, 78
e 79, estudei violão clássico, parei quando entrei para faculdade e fui morar
em Minas Gerais (Viçosa). Em 1983 estava de volta a capital estudando
Engenharia Agronômica na Universidade de Brasília. Loro Jones, que já era
guitarrista do Capital Inicial, morava próximo a UnB e eu também. Nos
conhecemos e frequentávamos os mesmos bares e festas e tínhamos uma turma de
amigos em comum. Numa vez num final de noite comecei a cantarolar e o Loro
falou que eu deveria aproveitar a voz que tinha e montamos um grupo (Virgens)
onde ele tocava baixo, José Flores (Finis Africae) tocava guitarra e Alessandro
Bambino (Escola de Escândalos) tocava bateria. O grupo durou uns três meses e
fizemos duas apresentações, uma numa festa de uma amiga e outra no Teatro
Escola Parque abrindo paro o Zero e Capital Inicial.
2)
O Nome Finis Africae foi tirado do livro
"O Nome da Rosa" e significa "nos limites da África",
assisti ao filme e percebi que se trata da área de acesso proibido ( livros
proibidos).
Exatamente
3)
Qual a
influência literária nas letras do Finis
Africae? Que livros e autores influenciaram a banda na década de 80?
Líamos
muito. A maioria do pessoal era universitário e Brasília propicia a leitura
graças a falta de opções de lazer que se juntava a nossa falta de grana e nos
colocava rumo a biblioteca. Trocávamos livros de todos os tipos, biografias,
romances policiais, roteiros cinematográficos, peças teatrais, poesia,
enfim,... Na década de 80 e especificamente eu e Neto (baixista do Finis)
curtíamos muito os Beatnicks: Allen Ginsberg, Jack Kerouac, Charles Bucowsky,
John Fante entre outros. Entre os nacionais destaco Rubem Fonseca, Ignácio de
Loylola Brandão e João Ubaldo Ribeiro. Além do Nome da Rosa de Umberto Eco
posso citar como boas lembranças títulos como: O sorriso do lagarto (João
Ubaldo), Pergunte ao pó (John Fante), Vastas emoções e pensamentos imperfeitos
(Rubem Fonseca), Obras completas (Oscar Wilde).
4)
Tem alguma música sua que fala de
algum livro? Ou alguma música que tem trecho de livros?
Pergunte
ao pó deu nome a uma música do Finis. Usamos o título original em inglês: Ask
the dust e a letra narra um evento que acontece no livro.
5)
O que
está lendo atualmente?
Estou
lendo A condessa de Barral de Mary del Priori e estou gostando.
6)
Como era
o seu convívio com o pessoal das outras bandas de Brasília nos anos 80? (
Capital Inicial, Plebe Rude e Legião Urbana), Renato Russo, Dinho Ouro Preto,
etc...
Era
muito legal. Brasília tinha um ar bem interiorano naquela época e haviam
diversos pequenos grupos sociais que as vezes se viam juntos em festas e shows
principalmente. Renato sempre foi muito reservado, saía pouco e gostava de
reuniões sociais com pouca gente, mas era um ótimo anfitrião quando se dispunha
a receber visitas. Também foi muito solidário. Antes dos Virgens, tive um grupo
chamado Objetos Oblíquos e Paulo Paulista que tinha sido anteriormente do
Aborto Elétrico tocava teclado. Faltava um amplificador de guitarra para
ensaiarmos. Paulo ligou para o Renato que disse que eu poderia passar lá e
pegar o dele na condição de deixar lá novamente depois do ensaio e assim foi
feito. Esse tipo de coisa rolava muito entre os grupos. Outro hábito típico
desse tempo era fazermos visitas a amigos que possuíam uma boa discoteca
munidos de fitas cassete para fazermos cópias. André Muller (Plebe Rude) que o
diga, mas havia a turma da Escola Americana da qual Felipe Seabra (Plebe Rude)
fazia parte que sempre apresentavam grupos novos e novos discos de grupos já
conhecidos. Nesse tempo eu não era muito próximo do Dinho, conversávamos e tal,
mas viemos a nos aproximar mais depois que saímos da capital.
7)
Quais as
melhores lembranças da época de Brasília?
Sem
dúvida as festas e os shows eram legais, mas também gostava dos festivais de
cinema, dos passeios de bicicleta, tardes nos clubes a beira do Lago Paranoá e
o céu no pôr do sol.
8)
Li que a
cena de rock de rock de Brasília na
década de 80 era diferenciada da cena de São Paulo e Rio de Janeiro, porque as
bandas foram mais unidas, começaram junto, todos cantavam com todos, o Dinho
fala muito isso nas entrevistas dele...
São Paulo
e Rio são cidades mais cosmopolitas. Você se desloca mais facilmente usando
transporte público o que era praticamente impossível lá em Brasília. Isso faz
com que as pessoas transitem mais em meios sociais diferentes e se tornem mais
ecléticas e independentes socialmente. Brasília era a junção de diversas
panelinhas onde você só entrava quando convidado por algum membro do grupo. E
nem todos que gostariam de participar desses grupos (panelas) eram convidados.
Havia muita solidão. Por outro lado uma vez dentro as pessoas se visitavam
mais, se telefonavam mais, enfim conviviam mais. Pesa também o fato de que a
maioria das pessoas que estavam lá, não eram de lá e isso faz com que você
invista em criar um círculo de amizades.
9)
O Finis
Africae ainda está em atividade?
O Finis
Africae encerrou as suas atividades em 2002. Depois disso me envolvi em alguns
poucos projetos musicais, sendo que retomei um deles o MIX 80, que é um grupo
que toca músicas dos anos 80. Junto com esses músicos fiz um show chamado: Eduardo
canta Finis, que até agora só foi apresentado uma única vez num Teatro aqui do
Rio no ano passado, contando com a participação de Cezar Ninne (ex-guitarrista
do Finis), Marlelo Hayena (Uns & Outros) e Bruno Gouveia (Biquíni Cavadão).
10) Eduardo, fique a vontade para indicar alguns livros
aos leitores do blog.
Grandes
Esperanças - Charles Dickens
Guia
politicamente incorreto da história do Brasil - Leandro Narloch
1808 - Laurentino Gomes
Colaboração na matéria: Eduardo de
Moraes
Finis
Africae em Brasília na W3 Norte, na sala de ensaio no Prédio
Radio Center.
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