O Gabriel Justino voltou com sua coluna de escrita criativa! Dessa vez, venha conhecer o belíssimo conto "A flor".
A flor, por Gabriel Justino
Diziam que este dia poderia chegar, finalmente ele chegou. Hoje o céu encobre a lua e não consigo vislumbrar as estrelas e a Via-Láctea. Faz muito tempo que tivemos um forte impacto em nosso planeta e as coisas desandaram rapidamente. As gerações que nos antecederam sabiam. Ficaram de mãos atadas e de vozes caladas, vendo um a um ceder espaço para o dito progresso. No decorrer das últimas décadas muitos pereceram, consequência de tudo aquilo que fomos incapazes de nos levantarmos para impedir.
Que esperança eu tenho? Que esperança nós temos? Meu vovô me contava histórias, de florestas que cobriam várias porções de terras e que ajudavam a manter o clima do planeta, histórias de águas limpas que corriam para o oceano, de uma natureza que não nos castigava insistentemente. Não sei se é verdade, mas porque ele mentiria para mim? Nunca vi uma árvore, diziam que elas davam sombra e nos alimentavam com seus doces frutos, nunca soube o que é tomar uma água mineral ou até mesmo respirar sem nossas máscaras com filtros. É realmente difícil de imaginar esse paraíso, que só consta nas histórias de meu vovô e passada de geração para geração através da oralidade.
Um dia, caminhando pela Capital percebi algo muito estranho naquele asfalto enegrecido e desgastado com o tempo, alguma coisa que me chamou a atenção. Não sei bem o que era, parecia romper o asfalto e destoava em meio ao cenário decadente dos prédios retorcidos. Era feia, mas me chamou a atenção. Em meio ao silêncio retumbante que tomava conta dessa avenida, foram poucos os momentos de sua história que ficou tão calma e tranquila, e vi o silêncio tomando conta, o entendimento de que aquilo era... não seria possível, seria?
Perdemos. Vejo isso quando avisto ao longe a torre do relógio que ainda insiste em ficar de pé e nos lembra constantemente do tempo que transcorre sem que a justiça nos alcance pelo que fizemos. Fizemos. Fomos nós que fizemos. As consequências de termos ignorado a ciência. Os dados estavam lá, para que todos pudessem ver e para que mudássemos de direção. Mas não mudamos. Permanecemos na inércia e acreditamos que tudo era uma mentira muito bem orquestrada para que poderosos pudessem assumir o poder.
Perdi o fôlego e quando o retomei, prendi a respiração, pois, não acreditava no que via, parecia a cena de um livro ou até mesmo aqueles programas de televisão. Rompendo o asfalto lá estava ela, feia e sem cor. Estava lá, inconfundível e plena, destoando da paisagem caótica, estava solitária, mas não era uma miragem e foi então que eu percebi, não estava mais nos livros, não estava em nosso imaginário, nunca pensei que a veria. Eram cinco da tarde e eu observando-a em minha posição sentada, lembrei-me de Drummond de Andrade, pois era feia, mas ainda assim era uma flor. Que furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio. E mostrou para nós os moradores restantes que nessa guerra, a mãe natureza venceu.
A flor, por Gabriel Justino
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Fonte: Google Imagens |
Diziam que este dia poderia chegar, finalmente ele chegou. Hoje o céu encobre a lua e não consigo vislumbrar as estrelas e a Via-Láctea. Faz muito tempo que tivemos um forte impacto em nosso planeta e as coisas desandaram rapidamente. As gerações que nos antecederam sabiam. Ficaram de mãos atadas e de vozes caladas, vendo um a um ceder espaço para o dito progresso. No decorrer das últimas décadas muitos pereceram, consequência de tudo aquilo que fomos incapazes de nos levantarmos para impedir.
Que esperança eu tenho? Que esperança nós temos? Meu vovô me contava histórias, de florestas que cobriam várias porções de terras e que ajudavam a manter o clima do planeta, histórias de águas limpas que corriam para o oceano, de uma natureza que não nos castigava insistentemente. Não sei se é verdade, mas porque ele mentiria para mim? Nunca vi uma árvore, diziam que elas davam sombra e nos alimentavam com seus doces frutos, nunca soube o que é tomar uma água mineral ou até mesmo respirar sem nossas máscaras com filtros. É realmente difícil de imaginar esse paraíso, que só consta nas histórias de meu vovô e passada de geração para geração através da oralidade.
Um dia, caminhando pela Capital percebi algo muito estranho naquele asfalto enegrecido e desgastado com o tempo, alguma coisa que me chamou a atenção. Não sei bem o que era, parecia romper o asfalto e destoava em meio ao cenário decadente dos prédios retorcidos. Era feia, mas me chamou a atenção. Em meio ao silêncio retumbante que tomava conta dessa avenida, foram poucos os momentos de sua história que ficou tão calma e tranquila, e vi o silêncio tomando conta, o entendimento de que aquilo era... não seria possível, seria?
Perdemos. Vejo isso quando avisto ao longe a torre do relógio que ainda insiste em ficar de pé e nos lembra constantemente do tempo que transcorre sem que a justiça nos alcance pelo que fizemos. Fizemos. Fomos nós que fizemos. As consequências de termos ignorado a ciência. Os dados estavam lá, para que todos pudessem ver e para que mudássemos de direção. Mas não mudamos. Permanecemos na inércia e acreditamos que tudo era uma mentira muito bem orquestrada para que poderosos pudessem assumir o poder.
Perdi o fôlego e quando o retomei, prendi a respiração, pois, não acreditava no que via, parecia a cena de um livro ou até mesmo aqueles programas de televisão. Rompendo o asfalto lá estava ela, feia e sem cor. Estava lá, inconfundível e plena, destoando da paisagem caótica, estava solitária, mas não era uma miragem e foi então que eu percebi, não estava mais nos livros, não estava em nosso imaginário, nunca pensei que a veria. Eram cinco da tarde e eu observando-a em minha posição sentada, lembrei-me de Drummond de Andrade, pois era feia, mas ainda assim era uma flor. Que furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio. E mostrou para nós os moradores restantes que nessa guerra, a mãe natureza venceu.
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