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Leandro no seu posto de atendimento |
Leandro Hauser, aluno do 5º semestre
noturno, trabalha na biblioteca da Câmara Municipal de São Paulo e entre suas
atividades está o atendimento ao público, composto principalmente por
estagiários de direito que trabalham na casa e cidadãos. A biblioteca é especializada, com seu acervo jurídico, mas de acesso público.
Os vereadores mesmo nunca passam por lá,
nem mesmo para retirarem livros apenas por prazer, sem necessariamente terem um
projeto de lei para ser estudado.
De
vez em quanto aparece algum assessor com alguma questão. “Outro dia, o assessor
do vereador Orlando Silva veio nos consultar sobre uma rua com o nome do
delegado do DOPS de São Paulo, Sergio Fleury Paranhos.” O policial é conhecido
por ser um torturador que perseguia obstinadamente os opositores do regime de
exceção no país, envolvido em diversas atrocidades, desde a caça à Carlos
Marighella em 1969 até a Chacina da
Lapa. Só por esse nefasto curriculum, qualquer homenagem já
seria uma
injustiça, mesmo que apenas um nome de logradouro público. “Queremos ter
certeza que a rua em São Paulo se refere ao delegado e propor a substituição do
torturador por uma de suas vítimas”, afirmava o usuário, justificando sua
pesquisa. O embasamento para a propositura da mudança de nome, estava,
descobriu Leandro com a ajuda de sua chefe, nos arquivos da Prefeitura, por que
o nome havia sido atribuído por um decreto do Executivo, não por um vereador
através de um projeto de lei.
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Leandro busca um livro para usuário |
"O que eu mais gosto de fazer, entre as minhas atividades, é o atendimento ao público. Eu faço empréstimos, devoluções ou renovações de livros, pessoalmente ou por telefone. Também cuido das estatísticas de consulta de periódicos e de jornais, consulta ao Diário Oficial do Município e auxilio na pesquisa de referência."
Conhecer o seu usuário é uma questão fundamental no atendimento ao público. "Muitos cidadãos que vêem aqui são frequentadores da biblioteca e sempre consultam os mesmos itens. Por não serem funcionários, não podem retirar material. Outros, como alguns moradores de rua que
já identificamos, passam a tarde folhenado uma revista por não terem
outro lugar para ir e por que aqui são aceitos."
A importância do serviço de referência e atendimento
O serviço de referência é uma das
atividades mais importantes da gestão de uma unidade informação. Na realidade
das bibliotecas é consenso entre os estagiários que são eles que, muitas vezes,
vão para a linha de frente fazer o atendimento ao usuário sem o devido
treinamento e supervisão.
“É
necessário que um bibliotecário dê apoio, treinamento e supervisione o trabalho
dos estagiários
ou outros profissionais que estejam no atendimento”, afirma a bibliotecária
especializada em serviços de referência e professora da FESPSP, Adriana Maria
de Souza.
“O usuário procura pela informação usando
uma linguagem natural, do dia-a-dia. Por isso a importância do bibliotecário de
referência fazer a entrevista de referência e passar dessa linguagem coloquial
para a linguagem técnica utilizada na biblioteca”, explica a professora.
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Professora Adriana |
Não é sem motivo que os cursos sobre
qualidade no atendimento ao cliente específicos para serviços de informação
estão muito em voga. Coordenadora do curso de extensão da FESPSP "Excelência no atendimento em unidades de informação", a professora Adriana aponta que a competência para desempenhar bem esta função é primordial: “Temos um problema hoje: a entrega. Ela
não é feita pelo bibliotecário e este muitas vezes deve dar o treinamento para
quem está na linha de frente. É responsabilidade do profissional
bibliotecário capacitar quem vai ficar ali, nessa função. Você nunca coloca
uma pessoa que não conhece o serviço. Você a prepara antes.”
Pessoas e pessoas
É,
mas sabemos que nem todo mundo tem o perfil ideal para ficar no atendimento. O
gestor deve saber explorar e incentivar os potenciais de seus colaboradores,
mas algumas características são requisitos básicos: “Os atributos são pessoais:
querer ter interesse depende de mim. Não é só profissional. Gentileza,
respeito, cooperação e comprometimento são características da pessoa, e não as
aprendemos na escola” cita Adriana. Mas, por outro lado, as pessoas podem ser treinadas para que se
comportem mais adequadamente no atendimento. A busca pelo perfil desta função
deve estar sempre entre as prioridades do gestor e o follow-up do processo é crucial para se manter a excelência, por
ser uma área extremamente dinâmica.
Atendimento é um processo de comunicação
Em atendimento, é aconselhável ir além do
cliché “para entendermos o nosso usuário, temos que entender o que ele precisa”.
Isso parece simples para o profissional que presta o atendimento, mas nem
sempre o usuário está ciente da sua própria necessidade. A função do
profissional de informação é fazer esta ponte entre o usuário e a sua
necessidade informacional e estar sensível à estas situações. E a auto-reflexão
é imprescindível para se mensurar o compromentimento com a entrega:
“Estamos transmitindo nosso conhecimento?
Estamos nos responsabilizando por essa informação?”, questiona a bibliotecária
e professora. “Atendimento é um processo de comunicação. Afinal, estamos nos
comunicando com eficiência com nosso usuário?”
Um cafezinho para a reflexão, por favor.
Quem
é Adriana Maria de Souza
Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da
Informação pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (2000).
Especialista em Gerência de Sistemas e Serviços de Informação pela Fundação
Escola de Sociologia e Política de São Paulo (2003). Mestranda no Programa de
Pós-Graduação em Ciência da Informação pela Universidade de São Paulo - ECA-USP
(2011). Atua como professora do curso de Biblioteconomia e Ciência da
Informação da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo e como
Consultora. Tem experiência na área de Biblioteconomia e Ciência da Informação,
com ênfase em Serviços de Informação, Tratamento da Informação, Coaching e
treinamentos de equipes.
Dewey foi o primeiro a pensar o serviço de
referência
O termo “reference service”, o nosso
“serviço de referência”, foi criado e utilizado pela primeira vez por Melvil
Dewey, em 1884. Naquela época, o profissional bibliotecário estava muito
vinculado a um perfil especializado em classificação e catalogação, e o
usuário, ou consulente, como era chamado, não era o foco dos serviços de
informação, e sim o acervo. Em seu artigo Circular
of Information, Dewey afirma que, entre as responsabilidades do
bibliotecários estava o “serviço de referência” e listou membros do
“departamento de referência” na Biblioteca da Universidade de Columbia, a qual
dirigia à época. Dewey entendia o serviço de referência como o “departamento
que, sozinho, era o mais importante em uma biblioteca”. Apesar do seu legado
mais conhecido ser a Classificação Decimal que leva seu nome, ele foi uma
personalidade que promoveu o movimento das bibliotecas públicas e a noção de
assistência individual ao leitor nas bibliotecas universitárias, revelando seu
pioneirismo também no atendimento ao usuário, como conhecemos hoje.
Ridendo castigat mores
São muitas as histórias de quem trabalha
com atendimento, das mais ingênuas às mais bizarras. Com
anos de experiência à
frente do atendimento da biblioteca do Clube Atlético Paulistano, a aluna
Roselene Medeiros, do 3º semestre noturno, colecionou algumas passagens
divertidas para provocar nossa reflexão:
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Roselene |
"Perolas, falta de bom senso e
perguntas irritantes em uma Biblioteca"
Temos que estar preparados para uma
infinidade de situações e necessidades dos usuários, para que se sintam
acolhidos e satisfeitos com o atendimento em uma biblioteca ou serviço de
informação.
Assim, as aulas de psicologia, gestão, sociologia, lógica e
todas as matérias técnicas têm razão de ser, pois temos que lidar com os
usuários da melhor forma possível e adequar o acervo a esse ser que às
vezes parece ser um tanto bizarro. Vejam alguns exemplos e envie o seu
comentário para enriquecer nosso repertório:
Antes de a biblioteca abrir:
Batem na porta com o aviso de
horário fixado nela.
Ao abrirmos a biblioteca:
“Por que não abrem mais cedo?”
Ao auxiliar uniformizado: “Você trabalha
aqui?”
Ao trocarmos a peça do uniforme: “Sua irmã
trabalhou aqui?”
Ao entrar: "Não consigo encontrar
nada"
Ao afirmarmos que um livro é ótimo: “Você
leu?”
Ao tentarmos fechar a Biblioteca:
“Por que não fecham mais tarde?”
“Tenho que sair?”
“Posso levar os jornais do dia? Ninguém
mais vai ler hoje!”
“Quero um livro sem morte, doença,
tragédia, sofrimento ou qualquer mal humano...”Dah.
“Quero um livro excelente!” (Na opinião de
quem?)
Após várias sugestões e uma pilha de 20
livros sobre o balcão:
"Não tem nenhum livro interessante...
volto depois"
“Detestei o livro que você me recomendou!”
“Quero um livro de um autor russo, chamado....
ah, quer dizer, dodo, dot, alguma coisa assim, você não tem? Ah, não? Você
não deve saber mesmo, da próxima vez soletro pra você, tchauzinho!”
“Livro infantil não é considerado livro
para empréstimo, né? É tão fininho!”
Muito bom...
ResponderExcluirMuito engraçado, eu já tive uma situação diferente na biblioteca em que eu já estagiei.
ResponderExcluirCômico é a palavra certa, muito boa a matéria... Saudades da Professora Adriana, mulher sábia, forte e determinada... São experiências assim que nos tiram de uma rotina monótona
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