No começo deste mês, uma escancarada discussão entre a presidente do Sindicato dos Bibliotecários do Estado de São Paulo, Vera Stefanov, e a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, colocou as bibliotecas escolares na linha de tiro. O estopim do agressivo debate foi um artigo do professor Vladimir Safatle entitulado "A biblioteca roubada".
Publicado
no dia 05 de fevereiro, no jornal Folha de São Paulo, o artigo aponta
vergonhosos números sobre inexistência de bibliotecas escolares nas escolas
públicas: 72,5 % das escolas do país não têm bibliotecas.
Comentando sobre os dados levantados por
Safatle no Painel do Leitor, Vera Stefanov afirmou que o texto era “feliz e
oportuno”, e que “mesmo com a lei nº 12.224/2010, o governo paulista mascara as
bibliotecas como salas de leitura, transformando-as, na verdade, num depósito
de livros e designando professores reabilitados para fazer o papel de
bibliotecário.” Stefanov também ressaltou que o cargo de bibliotecário foi
extinto do quadro funcional da Secretaria de Educação.
Em resposta publicada no dia 16 de
fevereiro, a Assessoria da Secretaria, na pessoa de Maurício Tuffani,
considera falsa a afirmação de que a Secretaria coloca professores no lugar de
bibliotecários, como mediadores de leitura. E também negou que o governo do
Estado estivesse descumprindo a Lei 12.224 por que o prazo para ela ser
cumprida é 2020.
Em réplica publicada no dia 16 de
fevereiro , Stefanov afirmou que a mudança de nome dos locais chamados de
“bibliotecas” para “salas de leitura” é fator determinante para a extinção de
concursos para o cargo de bibliotecários no Estado de São Paulo. A presidente
do Sindicato também classifica a resposta da Secretaria de “hipócrita”,
pois deixa claro que não há planos de se realizar concursos, afinal, o prazo
estipulado pela lei para suprir as escolas públicas com bibliotecários é,
justamente, 2020.
No
dia seguinte, em tréplica da Secretaria de Educação, novamente assinada por
Maurício Tuffani, lê-se que “a presidente do Sindicato dos Bibliotecários (...) não
entende ou propositalmente desconsidera o fato de que os professores que atuam
como mediadores de leitura nas escolas da rede estadual de ensino paulista
exercem atividade estritamente pedagógica. Exercício ilegal de profissão seria
empregar bibliotecários nessa função." O assessor finaliza sua resposta
afirmando que a Secretaria da Educação foi “atacada pela dirigente sindical em
seu desmedido protesto por mais empregos para sua categoria.”
Como último capítulo do embate, leitores
se pronunciaram a favor de mais bibliotecários nas escolas e o jornal associou
o tema à elogios a José Mindlin na publicação dos comentários.
Siga abaixo todas as etapas deste embate e
leve para sua sala esta discussão com seus professores. Como você se posiciona
nesta questão?
A biblioteca roubada
Vladimir Safatle, publicada em 05/02/2013 -
03h30
Vladimir Safatle |
"A Carta Roubada" é um dos contos mais célebres
de Edgar Allan Poe. Nele, o escritor norte-americano conta a história de um
ministro que resolve chantagear a rainha roubando a carta que lhe fora
endereçada por um amante.
Desesperada, a rainha encarrega sua polícia secreta de
encontrar a carta, que provavelmente deveria estar na casa do ministro. Uma
astuta análise, com os mais modernos métodos, é feita sem sucesso. Reconhecendo
sua incompetência, o chefe de polícia apela a Auguste Dupin, um detetive que
tem a única ideia sensata do conto: procurar a carta no lugar mais óbvio
possível, a saber, em um porta-cartas em cima da lareira.
A leitura do conto de Edgar Allan Poe deveria ser
obrigatória para os responsáveis pela educação pública. Muitas vezes, eles
parecem se deleitar em procurar as mais finas explicações, contratar os mais
astutos consultores internacionais com seus métodos pretensamente inovadores,
sendo que os problemas a combater são primários e óbvios para qualquer um que
queira, de fato, enxergá-los.
Por exemplo, há semanas descobrimos, graças ao Censo
Escolar de 2011, que 72,5% das escolas públicas brasileiras simplesmente não
têm bibliotecas. Isto equivale a 113.269 escolas. Um descaso que não mudou com
o tempo, já que, das 7.284 escolas construídas a partir de 2008, apenas 19,4%
têm algo parecido com uma biblioteca.
Mesmo São Paulo, o Estado mais rico da Federação, conseguiu
ter 85% de suas escolas públicas nessa situação. Ou seja, um número pior do que
a média nacional.
Diante de resultados dessa magnitude, não é difícil
entender a matriz dos graves problemas educacionais que atravessamos. Difícil é
entender por que demoramos tanto para ter uma imagem dessa realidade.
Ninguém precisa de mais um discurso óbvio sobre a
importância da leitura e do contato efetivo com livros para a boa formação
educacional. Ou melhor, ninguém a não ser os administradores da educação
pública, em todas as suas esferas. Pois não faz sentido algum discutir o
fracasso educacional brasileiro se questões elementares são negligenciadas a
tal ponto.
Em política educacional, talvez vamos acabar por descobrir
que "menos é mais". Quanto menos "revoluções na educação" e
quanto mais capacidade de realmente priorizar a resolução de problemas
elementares (bibliotecas, valorização da carreira dos professores etc.), melhor
para todos.
A não ser para os consultores contratados a peso de ouro
para vender o mais novo método educacional portador de grandes promessas.
VLADIMIR SAFATLE escreve às terças-feiras.
Vladimir Safatle é professor
livre-docente do Departamento de filosofia da USP (Universidade de São Paulo).
Escreve às terças na Página A2 da versão impressa.
Governo de SP mascara bibliotecas
como salas de leitura, afirma leitora
LEITORA VERA
STEFANOV
DE SÃO PAULO
DE SÃO PAULO
Publicada
em 09/02/2013 - 06h01
Feliz e
oportuno o texto "A
biblioteca roubada", de Vladimir Safatle.
Há anos,
a categoria dos bibliotecários vem reivindicando a inclusão de profissionais da
área no quadro funcional da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, que
extinguiu o cargo.
Mesmo com
a lei nº 12.224/2010, o governo paulista mascara as bibliotecas como salas de
leitura, transformando-as, na verdade, num depósito de livros e designando
professores reabilitados para fazer o papel de bibliotecário.
VERA STEFANOV é presidente do Sindicato dos Bibliotecários no
Estado de São Paulo
Secretaria de Educação
contesta carta de leitora sobre bibliotecas
MAURÍCIO TUFFANI
ASSESSOR DE COMUNICAÇÃO DA SECRETARIA DA EDUCAÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO
DE SÃO PAULO
ASSESSOR DE COMUNICAÇÃO DA SECRETARIA DA EDUCAÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO
DE SÃO PAULO
Publicada
em 15/02/2013 - 06h30
É falsa a
afirmação da Vera
Stefanov, presidente do Sindicato dos Bibliotecários no Estado de São Paulo
(Painel do Leitor), de que a Secretaria da Educação designa professores no
lugar de bibliotecários.
Na
verdade, tais docentes atuam como mediadores de leitura, em ações pedagógicas.
A missivista também errou ao acusar o governo do Estado de descumprir a lei nº
12.224, que, na realidade, estabelece para 2020 o prazo para que as escolas
brasileiras tenham bibliotecários.
Bibliotecas agora são
'salas de leitura', critica leitora
LEITORA VERA
STEFANOV
DE SÃO PAULO
DE SÃO PAULO
Publicada
em 16/02/2013 - 07h02
Vera Stefanov |
A resposta
da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo no Painel do Leitor é bem
esclarecedora.
Para nós, bibliotecários, é fácil deduzir, pelo teor da
resposta à nossa denúncia, que há mais de uma década não há concurso para o
cargo de bibliotecário porque os equipamentos mudaram de nome --em vez de
bibliotecas, temos "salas de leitura"; em vez do profissional
bibliotecário, temos professores (em exercício ilegal de profissão) que atuam
como "mediadores de leitura".
A resposta hipócrita deixa claro também que o governo do
Estado não está pensando em fazer concurso para bibliotecários, pois a lei
federal nº 12.224 tem um prazo até 2020 para ser cumprida. Com a atual
mentalidade da Secretaria da Educação, dá para entender por que mais de 80% das
escolas públicas do Estado mais rico da Federação não têm bibliotecas. Para um
bom entendedor, meia palavra basta.
VERA STEFANOV
é presidente do Sindicato dos Bibliotecários no Estado de São Paulo
Secretaria da Educação
rebate críticas de bibliotecários
LEITOR MAURICIO
TUFFANI,
ASSESSOR DA SECRETARIA DA EDUCAÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO (SÃO PAULO, SP)
ASSESSOR DA SECRETARIA DA EDUCAÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO (SÃO PAULO, SP)
Publicada
em 17/02/2013 - 06h30
A
presidente do Sindicato dos Bibliotecários no Estado de São Paulo, Vera
Stefanov (Painel do Leitor, 16/2), não entende ou propositalmente
desconsidera o fato de que os professores que atuam como mediadores de leitura
nas escolas da rede estadual de ensino paulista exercem atividade estritamente
pedagógica. Exercício ilegal de profissão seria empregar bibliotecários nessa
função.
A lei
federal 12.224, ao fixar para 2020 o prazo para as escolas de todo o país terem
bibliotecários, está em consonância com a prioridade da sociedade brasileira,
cujo foco está no aprendizado dos alunos e na carreira do professor. Essa é a
prioridade da Secretaria da Educação, atacada pela dirigente sindical em seu
desmedido protesto por mais empregos para sua categoria.
Leitores criticam falta de
bibliotecários e elogiam José Mindlin
Publicada em 18/02/2013 - 06h30
Leitores
comentam carta da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo sobre falta de
bibliotecas em escolas públicas no Estado.
Em
resposta ao assessor
da Secretaria da Educação (Painel do Leitor), para começar não existem
salas de leitura nas escolas do Estado: o que existem são depósitos de livros
que algumas escolas, com grande esforço de professores readaptados (professores
afastados da sala de aula por motivo de doença), conseguem manter em ordem.
Às vezes
temos a impressão de que esses gestores desconhecem as escolas, que necessitam
de muitos profissionais --psicólogos, dentistas, bibliotecários e mais
professores. Mas, com os péssimos salários, ninguém se interessa.
CRISTIANO MARIANO DE MOURA, professor (São Paulo, SP)
*
É
absolutamente verdadeira a afirmação de que a Secretaria da Educação de São
Paulo usa professores, muitas vezes readaptados, no lugar de bibliotecários nas
bibliotecas das escolas estaduais. Isso ocorre há décadas. Muitas bibliotecas
ficam anos fechadas por falta de pessoal. Investir em pessoal capacitado nunca
foi prioridade na educação pública. O resultado dessa política, todos nós
sabemos.
MARA CHAGAS (São Paulo, SP)
*
Os 60 mil
volumes doados pelo bibliófilo José Mindlin (1914-2010) à USP finalmente estão
acomodados num edifício construído para esse fim. A Biblioteca Brasiliana Guita
e José Mindlin é um raro exemplo de generosidade num país em que profissionais
e empresários bem-sucedidos não têm o hábito de devolver à sociedade parte da
riqueza que acumularam. Mas é também um caso das imensas dificuldades que
filantropos como Mindlin --que não viveu para ver o sonho realizado-- enfrentam
para fazer doações. Muitíssimos brasileiros ricos poderiam imitar esse nobre
gesto, pois desta vida nada se leva e muito pode se fazer em vida.
ANTONIO JOSÉ G. MARQUES (São Paulo, SP)
Há duas décadas, o Poder Público do Estado de São Paulo veem atuando de maneira a sucatear o espaço das bibliotecas nas escolas. Nos anos 1990, o então Governo Flery as transformaram em Centros de Informação e Criação (CICs).Depois, com a entrada dos Tucanos no governo, as bibliotecas escolares perderam completamente sua identidade ao serem substituidas por salas ambientes diferenciadas, tudo isso a rivelia dos argumentos do CRB8 que desde o princípio se opuseam a essas reestruturações que nada tem a ver com a educação. Entao meus parabéns a presidente do conselho. O proximo passo deveria ser ir as ruas gritar contra essa barbarie.
ResponderExcluirLilian, você tem toda a razão: não podemos aceitar ações como essas, é essencial que o profissional de informação, como representante primeiro das bibliotecas escolares, coloque-se à frente desta reinvidicação. Obrigada pela sua participação e continue nos acompanhando!
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