William Okubo |
William Okubo é uma da figuras mais presentes e atuantes da Biblioteconomia no país. Da área de gerenciamento e apoio de uma das maiores bibliotecas do Brasil, a Mário de Andrade, faz vôo de condor para analisar o cenário da biblioteca pública e cultiva o saudável hábito de visitar outras bibliotecas sempre que pode, para pesquisar no acervo, retirar livros, e claro, conversar com seus funcionários sobre tudo, inclusive, sobre bibliotecas públicas. E uma conversa com William é uma parada para pensar e sorrir, pois esse filho arretado de japonês com uma pernambucana faz da prosa um mar rico de histórias da literatura contemporânea e das bibliotecas por onde passou. Desde quando se formou em 1998 na USP, William tem se dedicado à área cultural e a promoção da biblioteca pública, propondo renovação e ação efetivas. Nesta entrevista gentilmente cedida para o blog da Monitoria Científica, William Okubo conversou com nossa monitora voluntária, Juliana França, sobre desafios e possibilidades na biblioteca pública:
MC: Por que escolheu
a Biblioteconomia como sua profissão?
OKUBO: Lembro-me que
até a metade do ensino médio, quando tinha uns 16 ou 17 anos, eu não era um bom
aluno na escola e nem um leitor. Foi pegando por acaso um livro do Érico
Veríssimo, o ótimo "Olhai os lírios do campo", pelas estantes de casa
que fui fisgado pela literatura e pela leitura, e a partir deste momento
comecei a participar mais ativamente das aulas, a ser escolhido para buscar informações
para montar e depois apresentar os seminários. A partir deste momento, notei
que tinha jeito para pesquisar informações e depois disseminá-las. Daí a
escolher o curso de Biblioteconomia foi um passo natural, tanto que as matérias
que mais gostei (apesar de nem sempre ter tirado boas notas - engraçado isso)
foram aquelas ligadas à disseminação da informação e as de teor mais
cultural/educacional.
MC: Quais os
desafios que você encara como fundamentais para o aprendizado na área?
OKUBO: É difícil
generalizar quais são os desafios, porque cada campo de atuação tem suas
próprias dinâmicas e problemas, mas creio que é preciso ter uma posição
proativa desde o início da carreira, seja nos estágios ou nas projetos de
iniciação científica. Essa posição proativa inclui buscar informações com os
colegas mais experientes, mesmo que você não realize a mesma atividade que
eles. A curiosidade ajuda nesse quesito. Um exemplo: devo ter catalogado uns 20
ou 30 livros durante minha carreira, mas mesmo assim, cheguei a supervisionar a
área de catalogação de duas bibliotecas. Mas como é possível isso? Acontece que
apesar de nunca ter catalogado/classificado obras, eu sempre espiei de perto a
forma como os profissionais especializados nestas áreas trabalhavam, hora ou
outra sempre conversava e converso com eles, e claro, analiso o resultado
de seu trabalho lendo etiquetas de lombada e catálogos eletrônicos, sem contar
que sempre dava uma olhada artigos dessa área.
MC: O que te
motiva a atuar numa Biblioteca Pública?
OKUBO: Primeiro é que
mesmo sendo meio tímido, gosto do contato com as pessoas, e o ambiente da
Biblioteca Pública é exatamente este.
Outra coisa que
sempre me motivou e ainda me motiva é a possibilidade de ajudar as pessoas a
encontrarem o que procuram. Querendo ou não, passamos a vida procurando coisas,
e acredito que a biblioteca pública é um dos lugares onde as encontramos. Nelas
podemos encontrar o nome e os efeitos de um remédio ou obter informações sobre
uma doença que o médico mal humorado não teve paciência de explicar. Também podemos
encontrar livros que nos ajudem a superar a falta dinheiro, de um emprego, de
amizade, de tempo, tudo isso em obras de auto-ajuda, por exemplo. Por fim, nas
Bibliotecas Públicas podemos aprender mais sobre relacionamento lendo romances,
ou mesmo, viver romances que infelizmente na vida real não temos coragem de
viver, sem contar a possibilidade de descobrir mais informações sobre arte,
religião, filosofia e esportes.
Enfim, acredito
que a biblioteca pública pode prover todo tipo de informação e entretenimento,
e é por acreditar que isso é possível que ainda me motivo, apesar de saber que
por mais que esteja em curso uma modernização das mesmas no país, o caminho
para termos bibliotecas que atendam ao menos metade do que prevê o
"Manifesto da UNESCO para as Bibliotecas Públicas" é muito longo. O
desafio é enorme!
MC: A Biblioteca
Pública é uma área em constante renovação. Na sua experiência, qual a mudança
mais positiva que favoreceu a interação entre usuário e profissional?
OKUBO: Infelizmente,
somente nos últimos anos a renovação retornou ao ambiente das Bibliotecas
Públicas do país. Ao ler ou ouvir sobre a história delas aqui em São Paulo, por
exemplo, vemos que a partir da década de 1930 até meados dos anos 1980 o
ambiente era de inovação e implantação de bibliotecas e de serviços de
extensão. Porém, em algum momento, essa renovação ficou meio travada. E o
travamento não foi culpa dos profissionais apenas, que fique claro. O
travamento ocorreu devido à transformação do Estado brasileiro em uma máquina
pesada e extremamente ineficiente, cheio de regras para evitar corrupção (e
como vemos essa estrutura toda não conseguiu evitar tantos e tantos casos).
Tudo é lento, tudo é demorado, e como as BPs estão dentro desse sistema está
sendo extremamente difícil mudar isso, mas vejo avanços desde que cheguei aqui
no final de 2001.
A mudança
principal que vi nesses anos é aparentemente bem simples: o retorno do
bibliotecário às atividades de mediação de leitura e de busca à informação.
Devido a histórica falta de pessoal, boa parte dos bibliotecários se tornaram
gerentes de áreas e ficavam nas suas mesas de trabalho, e com isso, a área de
atendimento ficou sem nossa presença. Com a retomada de contratação de
profissionais (insuficiente!) e algumas mudanças de estrutura organizacional
(insuficientes!) novamente temos bibliotecários no atendimento direto e também
orientando os auxiliares e estagiários. O bibliotecário como mediador,
estimulador de leitura e recuperador da informação, com o apoio atual da
Tecnologia da Informação, faz milagre!
Lá na Biblioteca
Mário de Andrade, na Biblioteca Monteiro Lobato e também no Ônibus-Biblioteca
onde trabalhei sempre que o bibliotecário estimulado e com perfil de
atendimento foi deslocado para "o matadouro" os resultados foram
impressionantes. Na Monteiro Lobato, por exemplo, a colocação de três
bibliotecárias leitoras de livros infanto-juvenis no setor de empréstimo fez
triplicar o número de empréstimo em um ano. Claro que depois desse tempo, elas
cansaram de preencher fichinhas, guardá-las em ordem e colocar livros nas
estantes. Com isso, elas cansaram, duas caíram fora. Isso aconteceu porque não
tínhamos à época a figura do pessoal de nível operacional ou do auxiliar de
biblioteca para realizar os empréstimos e também o sistema automatizado de
empréstimo hoje em funcionamento, deixando aos bibliotecários o papel de
mediador.
MC:Dê um conselho
aos estudantes de Biblioteconomia e Ciência da Informação sobre a Gestão em BP.
Juliana França e Andrea Andira, monitoras da MC, e William Okubo |
OKUBO: A gestão de BP´s
não é fácil como escrevi acima. Mas estamos em um momento onde novas formas de
gestão estão em implantação.
O caso da
Biblioteca de São Paulo (BSP) é um deles: com uma Organização Social gerindo-a, a contratação de pessoal, de prestadores de serviços especializados e a
aquisição de acervo se tornam mais ágeis, liberando tempo dos gestores para
implantar inovações nas áreas de atendimento e ação cultural. Porém, não é um
sistema consensual, pois sabemos que nem sempre a seleção das OS é feita
baseando-se em critérios técnicos. Não é o caso aparentemente da BSP. Destaco também o
ótimo trabalho nas Bibliotecas Parque do Rio de Janeiro.
Ao mesmo tempo,
apesar de ser uma biblioteca ligada à administração direta da Prefeitura de São
Paulo, lá na Biblioteca Mário de Andrade, conseguimos enfrentar os entraves
burocráticos e algumas barreiras foram rompidas:
- agilizamos as
compras de livros prospectando em órgãos públicos que compram de forma
diferente da tradicional e apresentando essas inovações ao pessoal da área
administrativa e jurídica que nos apoiou nessa mudança. Conseguimos criar um
edital para compra via pregão, nessa modalidade de compra, depois que a
distribuidora de livros apresenta o melhor desconto, basta encaminharmos
uma lista de livros e pronto, os recebemos. Falta um pregão para comprar livros
estrangeiros.
Ainda compramos
diretamente das editoras, onde para cada compra ainda é aberto um processo
administrativo, que conseguimos simplificar, mas o desafio é comprar várias
vezes ao ano pelo mesmo processo.
- na área de
tratamento da informação, além da criação do setor na Biblioteca (antes toda
compra e catalogação/classificação era centralizada na Coordenadoria do Sistema
Municipal de Bibliotecas) e da ampliação da equipe, aumentamos a velocidade de
processamento diminuindo o tempo entre a chegada do livro e sua
disponibilização ao público, certamente descem para as áreas de atendimento
mais de 100 livros por semana! Era algo impensável isso antes, tanto que lá
havia muita coisa sem catalogar parada há anos (ainda há, mas diminuiu muito).
- também foi
possível em uma reestruturação criar cargos de confiança técnicos, onde só
bibliotecários podem ser contratados, e nesse caso, quando não encontramos
algum profissional entre os efetivos (concursados) com o perfil do serviço ou
projeto que queremos desenvolver, podemos selecioná-lo no mercado e
contratá-lo. Deu muito certo, apesar de algumas (está bem, várias!) críticas a
esse modelo, e exatamente por ter essas críticas é preciso estudar melhor essa
estrutura, e o momento de mudança de gestão agora é ideal para isto.
Enfim, é preciso
que o bibliotecário obtenha conhecimentos de administração pública e seja
criativo para buscar coletivamente caminhos para desobstruir obstáculos que
ainda impedem as BP´s de se posicionarem melhor na área cultural, e claro,
começar a pensar em caminhos novos que terão que ser trilhados com eventos
novos com o livro digital.
Veja um pouco mais sobre o trabalho de William Okubo:
Na #Bibliocamp 2011, evento que propôs discussões sobre Biblioteconomia inspirada no BarCamp, William Okubo foi um dos palestrantes com o tema Inovações na gestão de bibliotecas públicas.
Saiba um pouco mais sobre a Biblioteca Mário de Andrade:
Viagens do conhecimento em 327 mil livros, a propósito da reabertura da Biblioteca Mário de Andrade em 2012
Biblioteca Mário de Andrade
Viagens do conhecimento em 327 mil livros, a propósito da reabertura da Biblioteca Mário de Andrade em 2012
Biblioteca Mário de Andrade
Gostei muito!
ResponderExcluirO William é mesmo um profissional ímpar! Obrigada pela sua mensagem, Margareth, e continue acompanhando o blog da Monitoria Científica!
ResponderExcluirO William é show, dedica muito do seu tempo a Biblioteconomia...mas dizem que quem faz o que gosta não está trabalhando...William une o útil ao agradável. Adoro esse Bibliotecário que já deu inclusive uma entrevista no Caçadores de Bibliotecas. Vejam que legal: http://cazadoresdebiblioteca.blogspot.com.br/2012/05/william-okubo-profissao-bibliotecario.html
ResponderExcluirOlá, Soraia, obrigada pela sua mensagem. Sua palavras sobre o William reforçam o valor do trabalho do bibliotecário dedicado, e a sua entrevista teve reflexos nesta para o blog da Monitoria, tenha certeza!
ResponderExcluirContinue acompanhando o nosso trabalho!
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ResponderExcluirCONHECI O WILLIAM OKUBO NA BIBLIOTECA MONTEIRO LOBATO E PUDE NOTAR QUE ELE AMA MTO A PROFISSAO E EU TB! É UM TRABALHO CULTURAL E EXIGE DEDICAÇAO! ADORO A PROFISSAO DE BIBLIOTECÁRIA ADMIRO O WILLIAM E SUA COMPETÊNCIA! ESPERO SER UTIL E ME COLOCO À DISPOSIÇAO DA MC DO WILLIAM E DA BMA! SENDO BIBLIOTECÁRIA PLENO - GESTORA DE DOCUMENTAÇAO - JORNALISTA E TRAD. INGL/PORT. GRATA E QUE DEUS OS ABENÇOE!
ResponderExcluirSOU A PESSOA ACIMA CARMEN LUCIA TROIANI!!!
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